Como o compliance pode atuar em assédio moral virtual no trabalho
Com o home office, as práticas abusivas mudaram, mas não deixaram de existir.
Os relatos de assédio moral virtual no trabalho durante a pandemia da Covid-19 acendem o alerta sobre a necessidade de uma atuação em conjunto dos setores de Compliance e Recursos Humanos nas empresas. O primeiro tem a responsabilidade de prevenir e combater práticas irregulares no ambiente corporativo, enquanto o segundo atua na gestão de pessoas, o que inclui o bem-estar e a motivação da equipe.
De acordo com o Tribunal Superior do Trabalho (TST), o assédio moral caracteriza-se pela “exposição de pessoas a situações humilhantes e constrangedoras no ambiente de trabalho”, o que pode ocorrer por meio de “comportamentos, palavras, atos, gestos ou escritos que possam trazer danos à personalidade, à dignidade ou à integridade física e psíquica”. Para o TST, o assédio moral é uma forma de violência que tem o propósito de desestabilizar emocional e profissionalmente o trabalhador.
Com a implantação do teletrabalho, em função da necessidade de isolamento social para conter a disseminação da Covid-19, a expectativa era pela redução dessa prática. No entanto, a realidade mostrou-se diferente: o assédio moral mudou de formato, mas ainda acontece nas organizações e tem impactado diretamente a saúde e o bem-estar dos colaboradores.
Ao longo de 2020, 1.625 casos de assédio moral e 79 de conduta foram julgados pelo TST. No entanto, esses números tendem a ser menores do que o total de casos, uma vez que a dificuldade de comprovar a situação e o medo de perder o emprego fazem com que muitos trabalhadores não denunciem os abusos.
Como identificar o assédio moral virtual
Na convivência entre telas, as práticas de assédio moral mudaram. Aprender a identificá-las é necessário para o trabalho de prevenção e coibição.
Um conjunto de ações pode caracterizar esse tipo de violência como: gritos e palavras ofensivas; cobrança excessiva de produtividade; ausência de horário de trabalho delimitado, o que engloba o envio de mensagens fora do expediente; desmerecimento do trabalhador que está em home office; atitudes discriminatórias; exclusão do funcionário; críticas à casa ou presença dos filhos durante reunião on-line; ameaça de demissão; dentre outros.
A psicóloga do Sindicato dos Servidores da Justiça de 2ª Instância de Minas Gerais (Sinjus-MG), Luciana Gaudio, alerta sobre a importância de compreender a configuração dessa prática. “O assédio moral tem um aspecto que, muitas vezes, pode ser sutil”, alerta. “Nas novas configurações de trabalho na pandemia, o assédio moral também vai ganhando novos contornos.” A especialista falou sobre o tema durante a live “Assédio Moral no Trabalho Remoto”, realizada pelo Sinjus-MG.
Brasileiros trabalham até 40 horas a mais no home office
Pesquisa realizada pela Oracle e Workplace Intelligence em 11 países, incluindo o Brasil, revelou que a saúde mental dos trabalhadores ficou mais fragilizada durante a pandemia. Com o home office, a fronteira entre trabalho e vida pessoal tornou-se mais confusa, e 42% dos brasileiros passaram a trabalhar 40 horas a mais por mês.
O levantamento também mostrou que 70% dos profissionais do país enfrentaram mais estresse e ansiedade no trabalho em 2020, na comparação com qualquer outro ano. Essa situação ocasionou problemas como insônia (53%) e o diagnóstico da Síndrome de Burnout (21%).
A pressão para atender padrões de desempenho foi apontada por 44% dos entrevistados como a principal dificuldade nesse período. Lidar com uma jornada de trabalho imprevisível foi citado por 39%.
Como o compliance deve agir
O setor de Compliance deve disseminar uma cultura organizacional contra o assédio. Isto deve ser feito a partir de diretrizes internas que precisam ser amplamente divulgadas a todos os colaboradores, incluindo a alta direção. Para isso, podem ser utilizados os canais de comunicação da empresa.
A realização de campanhas e treinamentos internos sobre o tema, ação que pode ser realizada em conjunto com o setor de Recursos Humanos, contribui para a prevenção de práticas abusivas nas relações de trabalho e, também, para o colaborador identificar irregularidades.
Outro ponto importante é ter um canal de denúncias que ofereça segurança para os funcionários informarem esse tipo de problema, inclusive com a opção de anonimato do denunciante. As informações recebidas devem ser investigadas e, uma vez constatadas, é preciso garantir a aplicação das sanções previstas pela organização.
O desvio de conduta moral de um ou mais profissionais é responsável por prejudicar a imagem e a reputação corporativa. De acordo com a pesquisa Riscos de Conduta 2021, 85% das empresas do país afirmam ter canais de denúncia preparados para receber informações sobre irregularidades, dentre elas, o assédio moral.
O estudo foi realizado pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), o Instituto dos Auditores Internos do Brasil (IIA Brasil), a Associação de Examinadores Certificados de Fraudes (ACFE Brasil), a Câmara de Comércio Internacional (ICC Brasil) e a consultoria Deloitte. As instituições sugerem uma integração interna entre os diferentes setores das empresas, incluindo a alta direção, para o empenho em prevenir e coibir os desvios de conduta.