A chegada do novo coronavírus no Brasil desencadeou uma série de medidas de distanciamento social com impactos profundos à economia. Estimativas recentes divulgadas pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é de que o PIB brasileiro pode cair até 9,1% se o país enfrentar uma segunda onda de contágio.
A paralisação de muitos serviços e estabelecimentos e confinamento domiciliar de parte da população teve um impacto direto no setor de reciclagem brasileiro e à vida dos profissionais que sobrevivem dessa atividade tão importante para o meio ambiente.
Segundo a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Públicas e Resíduos Especiais (Abrelpe) em seu estudo Panorama dos Resíduos Sólidos 2018, o Brasil produz em média 80 milhões de toneladas de lixo por ano. Desta enorme quantidade de resíduos, quase um terço ainda é despejados em lixões a céu aberto e apenas 3% é devidamente reciclado.
Mesmo que em quantidade menor do que o desejado, todo o lixo reciclado do Brasil depende diretamente do trabalho dos catadores, que são os responsáveis por 90% da coleta destes materiais.
Mas, durante a pandemia, o ramo sofreu um apagão, já que estes profissionais também deixaram de circular durante a pandemia. Até mesmo processos importantes como a logística reversa foram interrompidos e grandes galpões e comércios, geradores de grande quantidade de material reciclável fecharam as portas dificultando o sustento dos catadores autônomos e cooperativas.
No estado de São Paulo, por exemplo, a Cetesb publicou uma portaria em abril (Decisão de Diretoria nº 035/2020) que suspendeu o cumprimento das metas de todos os sistemas de logística reversa — processo de recuperação de seus produtos no fim do ciclo de vida e/ou suas embalagens que devem retornar ao fabricante, e que depende da coleta manual dos resíduos —, desde que continuem remunerando as cooperativas ou oferecendo algum tipo de assistência social aos catadores durante a pandemia.
Práticas mais sustentáveis para o futuro
Ainda é difícil mensurar todos os impactos sanitários, econômicos e sociais de um mundo pós-covid-19, mas o Brasil ainda tem muito a fazer quanto sua relação com a geração e tratamento dos seus resíduos sólidos.
Enquanto países desenvolvidos, como a Alemanha aplica multas aos cidadãos que não separam corretamente o lixo doméstico e conseguem alcançar níveis expressável de reciclagem movimentando 70 bilhões de euros todos os anos, o Brasil ocupa o quarto lugar no ranking de maior poluidor plástico do planeta segundo o levantamento do Banco Mundial.
Ainda mais agravante é que, das 10,3 milhões de toneladas de resíduos plásticos coletadas aqui, apenas 1,28 (145 mil toneladas) são de fato recicladas.
De acordo com uma pesquisa realizada pelo instituto Ipsos em 2019, 54% dos brasileiros entrevistados não sabiam como funcionava ou se havia algum sistema de reciclagem em suas regiões.
“O Brasil pode obter mais benefícios com com a reciclagem e favorecer o meio ambiente, ao mesmo tempo que injeta receita em empresas especializadas em tratamento de resíduos” explica o CEO da VG Resíduos, Guilherme Arruda. A startup mineira já foi premiada por iniciativas como a plataforma Mercado de Resíduos (que conecta empresas geradores de resíduos aos tratadores interessados na compra deste material) e recentemente conquistou a Certificação B de Avaliação de impacto.
De acordo com o Sindicato Nacional de Empresas de Limpeza Urbana (Selurb), o Brasil perde cerca de R$ 5,7 bilhões por ano apenas com a falta de coleta adequada e reciclagem do lixo plástico gerado no país.
Caso não haja um empenho conjunto entre a sociedade civil, empresas e poderes públicos capazes de aplicar ações educativas, isenção de tributos e diminuição de despesas logísticas para a ampliação da reciclagem, o Brasil continuará a ser um dos países com os menores índices de reciclagem do mundo pós-coronavírus.